Compulsão
Esse tema foi abordado de forma sintética em entrevista ao vivo cedida para a RTM – Radio TransMundial em 14/08/2019. O que se segue abaixo, é um texto um pouco mais completo em relação ao que foi tratado na ocasião da entrevista, embora ainda econômico em relação à complexidade e natureza do assunto.
As pessoas que são acometidas por compulsões, muitas vezes não se dão conta dos prejuízos que elas podem causar para si e para os outros. Pode-se pensar que, em muitas circunstâncias o indivíduo acometido por compulsões, não direcione o foco de atenção para os prejuízos causados e tão somente direcione seu olhar para os rituais que são manifestos pelas compulsões. Por esse motivo, muitos pacientes postergam anos para procurar ajuda profissional. Outros, embora percebam seus comportamentos inadequados e o prejuízo causado aos entes queridos e aos colegas de trabalho, não buscam ajuda por terem vergonha de falar sobre elas. Aliás, somente ao falar sobre elas, sofrem como que se estivessem fundidos aos seus pensamentos, que ao serem relatados sentem-se como que se “assumindo ser” verdadeiramente imorais, sujos, imperdoáveis.
Interessante perceber como esses pacientes se colocam sob um holofote exclusivo, esquecendo-se de analisar que outras pessoas podem ter as mesmas compulsões, os mesmos pensamentos, e com isso pode existir alternativas de como se lidar com essas compulsões. Enfim, acreditam que as compulsões são exclusivas deles. Algumas pessoas toleram mais pensamentos intrusivos, não dando tanta importância a eles, e assim sendo, eles vão embora. Outros são mais sensíveis, não conseguem tolerar tanto, e acabam reagindo a elas através de rituais.
A causa das compulsões
A literatura explica da seguinte forma: Para Freud, criador da Psicanálise, através de seus estudos, explica que as neuroses obsessivas (assim chamadas na ocasião) se originavam por uma fixação do prazer na fase sádico-anal. O indivíduo sentia prazer ou desprazer nessa fase e, por conta dessa fixação, reagia com forte repressão de impulsos agressivos contra as figuras parentais. Na prática, é como que se uma criança nessa fase denominada anal (fase onde está ocorrendo o aprendizado do controle dos esfíncteres), fosse fortemente repreendida, disciplinada pelos seus pais, e essa disciplina fosse sentida pela criança com sendo uma forma de se tratar com muita aspereza, humilhante e vexaminosa.
A criança por sua vez, passava a ter comportamentos como que compensatórios. Ao invés de dirigir a agressão contra àqueles que a disciplinaram, passassem a realizar comportamentos rituais. Freud trouxe um outro exemplo, este de um caso clínico, onde o indivíduo tinha pensamentos obsessivos, repetitivos relacionados a um rato que escavava suas entranhas e que o dano causado por essas escavações poderia também acontecer com sua namorada e com seu pai. Melanie Klein, dando continuidade ao conceito de neurose obsessiva, observou em crianças comportamentos ritualísticos ao que denominou em algumas situações como sendo tiques, diferenciando dos atos compulsivos.
Aqui podemos trazer algumas reflexões. Uma delas é que crianças também sofrem de compulsões desde muito cedo. Estatísticas já foram apresentadas no sentido de estratificar em qual gênero as compulsões são mais frequentes, mas elas aparecem em todos os gêneros e em todas as idades. Outra reflexão é sobre a questão dos pensamentos persistentes e intrusivos que caracteriza a problemática da compulsão.
Sempre a compulsão é precedida por uma obsessão, ou seja, um pensamento frequente, que traz desconforto e grande ansiedade ao indivíduo, que por sua vez tenta a todo custo livrar-se desse pensamento. As formas de se livrar do pensamento intruso, automático são variados, por exemplo: evitando-os, pensando em outra coisa, tentando fazer outra atividade que ocupe a atenção, andar, escutar música. Todos esses ensaios, na tentativa de afugentar tais pensamentos são caracterizados pelos comportamentos compulsivos. Ao invés de afugentar os pensamentos, alguns ficam ruminando horas a respeito deles. Fugir ou ruminar, de alguma forma traz algum alívio momentâneo, mas isso só reforça o circuito vicioso das compulsões.
Vale lembrar o que foi antes mencionado, todos temos pensamentos intrusivos, que nos direciona a atenção para seu conteúdo. Algumas pessoas logo deixam de pensar neles, outras por valorizarem tais pensamentos, entram num estado compulsivo.
Veja um exemplo interessante de que de todos nós de alguma forma temos pensamentos intrusos.
Vamos fazer o seguinte exercício: Pare de pensar a partir de agora, mesmo que você tenha que ler o relato a seguir para entender o exercício. Lembre-se pare de pensar!!!!
Imagine que você está nas ruas de Londres, ou em uma esquina qualquer, e um urso branco, muito elegantemente vem caminhando para perto de você. Ele chega mais perto, andando vagarosamente, e ele olha para você, e se levanta sobre suas patas traseiras e fica olhando para você. Pronto!!! Sendo sincero consigo mesmo, você conseguiu não pensar no Urso branco? Muito provável que não!!! Mesmo que a comanda dada ao início tenha sido: pare de pensar.
Atualmente a Terapia Comportamental Cognitiva entende que as compulsões são oriundas de pensamentos intrusivos, que foram de alguma forma alimentados e interpretados de forma errônea pelo indivíduo. As técnicas avançadas da terapia comportamental cognitiva buscam auxiliar o paciente na reavaliação dos pensamentos e crenças que ele tem. Assim, o individuo que sofre de compulsões, por conta dos pensamentos que ele nutre, são fortemente beneficiados pelas técnicas oferecidas pela Terapia Comportamental Cognitiva.
Se você se identificou com este texto ou conhece alguém que está passando por isso, é hora de procurar ajuda. A Psicoterapia pode ajudar muito nesses casos. O Paciente com pensamentos intrusos e compulsão, aprenderá junto com seu terapeuta técnicas para reformular os pensamentos e assim se tornar mais autônomo, dono dos seus pensamentos.
Autor: Daniel Fortes